A Psicologia Hospitalar e o Luto

A Psicologia Hospitalar e o Luto

Agosto 8, 2020 8 Por ADM

Antigamente a morte vista diferente do que é hoje, antes ela ocorria nas casas. Os velórios eram feitos em casa, com a família era reunida e cada uma tinha seu próprio ritual, que muitas vezes eram ligados a uma religião.

Com o avanço da medicina e dos hospitais, a morte passou a ocorrer em hospitais longe dos familiares e foi se criando a ideia de que a morte é algo a ser combatido, a ser vencido a todo o custo, trazendo consigo a ideia de que ela é uma derrota, quando na verdade a morte não é uma é apenas um fato.

Dentro de um hospital  nós, psicólogos hospitalares, acompanhamos os pacientes nos mais diversos momentos, na sua chegada, com sintoma, sem diagnóstico, durante o tratamento e durante a cura ou durante a morte.

Com a perda de um paciente, podemos vivenciar no ambiente hospitalar diversos lutos, seja o do paciente, do familiar e da equipe e vamos falar sobre eles…

O Luto no Hospital

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O luto é um processo, dinâmico, fluido e que se transforma com o tempo. É um processo de aprendizagem que inclusive é relacionado a cultura.

Cada cultura, cada religião vive e expressa os sentimentos relacionados a morte a sua maneira. Por exemplo, na Índia  os rituais da morte ocorrem no rio Ganges, acreditam que seres humanos reencarnam em animais. Já nos Estados Unidos faz-se um ritual de despedida onde as pessoas falam sobre o ente querido, é bem comum vermos isso em filmes. Os católicos fazem a missa do Sétimo dia, os Judeus fazem orações e rituais, enfim cada um tem sua maneira de lidar com a morte.

O luto do paciente

Muitas vezes ao receber uma notícia de doença grave e incurável, o paciente pode perceber e observar em si a progressão da doença e perceber a aproximação da morte, podemos chamar estas sensações do luto do paciente, na qual:

  • O paciente se enluta pela pessoa que ele foi;
  • Pela perda da autonomia;
  • Pela perda do trabalho;
  • Pela perda da identidade;
  • Perda dos laços sociais;
  • Separação temporária pela hospitalização/ Separação definitiva pela possibilidade de morte, etc.

Quando falamos sobre o luto do paciente não podemos deixar de citar a obra da psiquiatra Elisabeth Kluber-Ross e seu livro “Sobre a Morte e o Morrer”, na qual ela descreve sobre o processo de morte e morrer de pacientes e nele ela apresenta algumas fases sobre a morte que são mais conhecidas como as cinco fases do luto, que são: Negação, Raiva, Barganha, Depressão e Aceitação. A partir da leitura dos livros da Kluber-Ross, é possível perceber que suas obras são de extrema beleza, e é voltado diretamente ao paciente e não aos familiares.

Vale ressaltar a frase da doutora Ana Claudia Quintana médica brasileira  paliativista que diz que “o luto é um grande montanha russa.”

Luto do familiar

Para as familias  o luto começa quando há o adoecimento, passa pelo tratamento, pelo óbito e pelo pós óbito.

Antes que exista a perda concreta de seu ente querido a pessoa acompanha o declínio de seu familiar.  Inicia-se ai no início do diagnóstico o processo de Luto antecipatório.

Luto antecipatório

É um processo de luto que se inicia antes da morte, são as reações emocionais na eminencia de uma perda, que traz consigo reações de pesar e reflexões, que podem ser inclusive positivas, fazendo com que a pessoa se aproxime de seu ente, se desligando aos poucos do afeto. Contudo, pode ser negativo também, trazendo prejuízo na qualidade de vida.

O processo de luto antecipatório depende da relação das pessoas envolvidas e da dinâmica psíquica de cada um. Nela envolve a qualidade da relação com aquela pessoa, a história de vida e história de morte. Geralmente, alguém que morre sofrendo, causa um luto mais sofrido do que  alguém que morre em paz.

A experiência do luto é desorganizadora, muda a vida de forma geral, fazendo com que o enlutado se torne uma outra pessoa, agora um novo mundo.

No luto antecipatório tem algumas intervenções que podem ser feitas como por exemplo, coisas práticas, os médicos avisam a eminencia de morte, há a liberação de visitas.

Para nós psicólogos cabe a escuta, a presença genuína, facilitar a expressão dos sentimentos e validá-los quando se fazem expressos, fortalecer e buscar recursos de enfrentamento, bem como validar os cuidados que a família oferece e acolher a angústia.

O processo de luto pode passar por um período agudo, logo após a perda e ele pode se complicar ou se integrar.

Se a gente fizer um trabalho durante a fase antecipatória as chances de ter um luto complicado diminui muito.

Luto da equipe

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A equipe multiprofissional e isso inclui a todos, inclusive os profissionais da psicologia hospitalar, cuidam integralmente do paciente e quando há a perda dele, não é nada fácil, principalmente dependendo da idade e motivos da morte.

O luto da equipe, é um luto negado, não reconhecido, pois a experiência de perda não pode ser admitida, o luto não pode ser expressos, não há suporte social, mas ele é real.

Nesses casos, é importante que haja espaço para que a equipe também possa expressar seus sentimentos e possa também elaborar seu luto.

Para finalizar vamos encerrar com uma frase do Colin Murray Parkes

“O desejo de olhar de frente para os problemas do luto e do enlutamento em lugar de voltar as costas para eles é a chave para um trabalho bem sucedido com o luto… Os que estão presos nos lembram da precariedade de nossa liberdade, os pacientes de câncer nos lembram nos lembram da nossa própria condição de mortais. Os imigrantes que usurpam nosso território, a viúvas e os viúvos que nos provam que a qualquer momento nós também podemos perder as pessoas que amamos são fonte de ameaça e ansiedade.  Escolhemos lidar com o medo virando as costas para aquilo que o causa, rejeitando o prisioneiro, tentando animar o paciente com câncer, excluindo o imigrante, ou evitando o contato com a viúva e com o viúvo. Mas cada vez que fazemos isso somente aumentamos o nosso medo perpetuamos os problemas e perdemos a oportunidade para nos preparar para as mudanças que são inevitáveis em um mundo em transformação”